quarta-feira, 27 de maio de 2009

Paulinho Pedra Azul


Ele é cantor, compositor, artista plástico, escritor, além de um excelente contador de causos, enfim, é um artista completo. Hoje tem mais de 25 anos de carreira e vários discos gravados de forma independente, sempre com muita qualidade e sua marca registrada.

Abaixo, o registro de uma matéria sobre o início de sua carreira, publicada no jornal “Nossa Música”, de Belo Horizonte, em sua edição no. 12 do mês de dezembro de 1983.
O texto é de Vera Guimarães e a foto que ilustra a matéria é de Fernando Furtado.


“Bem te vi, Tocador sem destino: Paulinho Pedra Azul”

“Falar de Paulinho Pedra Azul é, antes de qualquer coisa, falar de um grande seresteiro. Na simplicidade de seus versos, a gente sente o clima da cidade do norte de Minas, desprovido das modernices da capital. Daí o convívio amigo das pessoas (que ele dá extremo valor), o ouvido colado no rádio, a música coçando as pontas dos dedos. O contato com o violão foi inevitável, que aliás, era do irmão mais velho e tinha que ser dedilhado escondido.

Oito anos de vivência em São Paulo, não tiraram o lirismo das canções e dos gestos. A coisa envolve platéias carentes de algo tão simples: simplicidade. Se perguntado pelo que é sua música, Paulinho não sabe responder ao certo. É um trabalho intuitivo, que um dia pensou ser inferior. Hoje Paulinho está consciente do reconhecimento e isso tem muito a ver com a sua batalha solitária.

Quando morava ainda em Pedra Azul, as coisas novas chegavam pelas rádios, ou pelos amigos que vinham para Belo Horizonte estudar. O pessoal levava discos dos Beatles, Stones, James Taylor, The Mamas and the Papas, e o rapaz Paulinho, fascinado, “O que é isso? Beatles ?” Essas influências iam se agregando a outras, bastante seresteiras: Nelson Gonçalves, Dilermano Reis, Nelson Cavaquinho, e deu no que deu! Tempos depois, os amigos continuavam trazendo novidades de outras paragens. E as histórias contadas o impulsionavam para a metrópole, São Paulo.

Antes disso porém, não podemos omitir o vento novidadeiro dos Festivais, com eles era sempre certo que tinha um público pra ouvir. Em 1972, Festival Folk-Rock-Pop do Sertão em Pedra Azul, só não foi apanhado pelo impacto, porque estava na organização e tinha que manter a cabeça fria. Foi um acontecimento muito louco (no bom sentido), que a cidade não esperava, “a cidade fica tão cheia, que foi preciso pegar um caminhão e despejar gente na Rio/Bahia. E naquela época era hippie, não era mochileiro, era hippie mesmo. Foi uma loucura gostosa, mesclada com aquela coisa interiorana: leite de vaca tirado na hora, muita árvores, coisa de roça que aquela turma que foi do Rio, São Paulo, não tinha muito contato.” Teve ainda os Festivales. Em 77, pegou o 1º lugar com “Ave Cantadeira”, que já estava pronta há muito tempo. Tem gente que acha o Festivale muito fechado, pois só músicos da região podem participar. Paulinho defende, lembrando que existem o baixo, médio e alto Jequitinhonha, e que por isso são três culturas interligadas, mas de formação diferente, “se abrir, vai descaracterizar o objetivo de divulgar isso tudo. Não que vá piorar, mas se o objetivo é valorizar as coisas do Vale, não justifica.” Por causa de posições como essa, Paulinho Pedra Azul enfrenta alguns rótulos. O de divulgador da cultura folclórica do Vale do Jequitinhonha, por exemplo. Seu trabalho fala do Vale, mas não é só isso. O pique é muito mais seresteiro, do que qualquer outra coisa, e isso de seresteiro está em todos os interiores do Brasil, seja no sul ou no norte.

Já faz oito anos que Paulinho se mandou pra São Paulo, buscar a sua brecha. A cidade que oferece tudo que se queira, acolheu o mineiro como a todos, cada um pra si e a cidade pra todos. Sorte que amigos de infância estavam lá para ajudar a segurar a barra, no buteco Fulo da Laranjeira, de propriedade de um deles. Tocava e conhecia gentes , Diana Pequeno, Dércio e Dorothy Marques, Elomar. Aos poucos, sentiu que aquele ainda não era o seu lugar, que seria preciso conquistar um, em outro local. O espaço restrito ia sufocando, foi preciso mesmo mudar de ares. Passou por cerca de 50 cidades do interior paulista, fazendo shows em unidades da FEBEM, tocando para crianças e até para os internos maiores. Experiência gratificante, que ao mesmo tempo serviu para tirar o medo de mostrar suas músicas, coisa de mineiro em terra de paulista.

Nos contatos com as pessoas, Diana Pequeno acabou gravando duas de suas músicas em seu 3º LP, “Vagando” e “Estrelas Mil”. A partir daí foi pintando interesse por parte da RCA, que ofereceu um contrato por três anos. A gravadora, é claro, queria concessões e diante da resistência de Paulinho: geladeira por 1 ano e seis meses. Já tava partindo pro disco independente, quando finalmente cederam 12 dias de estúdio. Como tudo estava pronto desde a época da assinatura do contrato, num instante tava gravado o “Ave Cantadeira”, verdadeiro e simples. Disco pronto, a história não foi diferente, nada de divulgação e mesmo lançamento. Aí começou uma parte muito interessante, com a qual muito artista independente tem o que aprender. O moço partiu pro show, levando o disco debaixo do braço e vendendo. Acabava, comprava mais e começava tudo de novo. Só nessa brincadeira foram 700 discos e com a divulgação boca a boca atingiu a marca dos 10 mil LPs vendidos. A RCA que não esperava nada, levou o maior susto com os pedidos chegando à fábrica, sendo obrigada agora a relançar a Ave Cantadeira.
Contrato renovado, resultado de uma guerra solitária, Paulinho Pedra Azul encantou o público que lotou por três dias o Teatro Chico Nunes, em Belo Horizonte. No palco, despojado e carinhoso para com o público, fica a imagem sonora de um seresteiro de marca maior.”

Nenhum comentário: