sábado, 9 de fevereiro de 2008

Abel Silva - O livro

MUITO PRAZER

Eu sou assim
Quem quiser gostar de mim
Eu sou assim

Wilson Batista

Não posso lhes dizer quem sou
porque me ocorre não ser exato
e desconfiar dos seguros
dos abstêmios e dos inocentes.

Relâmpagos, marés, triângulos,
amo as naturezas pontiagudas
e os devastados pela paixão.



Amo a água e o vento
que ensinam o método dos arrancos
e aos espasmos trituram
rochedos milenares.

Amo intensamente o mar
e sua capacidade de ser ao mesmo tempo
de frente
e secreto.

Amo os cavalos
que Clarice Lispector chamou de
“os mais nus dos animais. ”

Amo os colibris, os tiês e os sabiás
mas respeito a grande capacidade de organização de massas
dos pardais.

Tenho uma sincera antipatia pelos pombos.
eles burocratizam o vôo e
pombas, como rodopiam pra comer alguém...

Considero todas as religiões boas
pra quem gosta de dizer
amém.

Não amo o dinheiro
mas não tenho preconceito.
cá pra nós, é mesmo vil o tal metal !
eu concluo isto toda vez que recebo
o meu Direito Autoral.

Nascido em fevereiro
imagino algumas relações naturais
por uma ótica ao revés:
sonho peixes pescando as gaivotas pelos pés.

Amo a palavra
e entendo o desamparo de quem não consegue pronunciar
PROBLEMA, CLÁSSICO E METEOROLOGIA.

Todos os infernos existem
mas pra ser sincero
eu não mereço nenhum.

Tiro de letra qualquer uniforme
e sairia feliz na Beija-Flor
num terno de estopa:
meu andar é que me leva
não a minha roupa.

Não ponho cartas
não jogo búzios, não leio horóscopos
não bebo destas minas
astrais:
“nada está escrito”
como ensina
Octavio Paz.

Pois é,
eu sou assim:
muito prazer, Abel.
não seja Caim.

(Texto de apresentação para os espetáculos do autor no projeto POETA, MOSTRA A TUA CARA de Solange Kafuri).

In: “Só uma palavra me devora” – Abel Silva – Ed. Record, Rio de Janeiro, 3ª, ed, 2001
Páginas 146 a 148.

Nenhum comentário: